O fim de semana não foi tão agitado quanto eu esperava na imprensa escrita, depois da publicação da
carta-manifesto de FHC. O ex-presidente desabafou e fez críticas ao seu próprio partido, em como a campanha eleitoral está se desenrolando e também criticou parte do "sistema político".
Eu tenho sentimento neutro pelo FHC, mas tenho
vários motivos para não gostar dos oito anos em que ele esteve à frente deste país. Muitos devem pensar "RÁ! mais um petista", mas eu não votarei no Lula neste ano. Já tenho meu candidato (candidata?) e contarei quando achar necessário, embora alguns já saibam a minha escolha.
Vou citar alguns pontos da carta do FHC e fazer o contraponto. Ora, se ele pode se manifestar, eu também posso. E tentarei resgatar a memória dos brasileiros para os anos em que o FHC foi presidente. Os "quotes" são as palavras de FHC. E logo após meus comentários.
...pensando mais na Nação que em seus umbigos e nada mais faz do que se jactar de grandezas inexistentes.
Falou o político
"menos vaidoso" do país...
Pagar mensalão para deputados, comprar seus votos, não é igual sequer a outra transgressão, a de não declarar dinheiro obtido para a campanha eleitoral, o "caixa dois". A razão é simples: no caso do caixa dois, a fonte do dinheiro usado geralmente é privada, embora nem sempre o seja, e o objetivo é ajudar algum candidato individual em sua eleição. ... No caso do mensalão a fonte foi pública; é roubo do dinheiro do povo, ainda que empréstimos fictícios de bancos privados tenham sido usados para encobrir esse fato.
Comprar votos agora é ilegal. Em 97, para a reeleição, não foi. Caixa dois agora é o pior dos pecados. Em 1986, para o senador Arthur Virgílio (um dos políticos mais ferrenhos e sujos do PSDB), era coisa normal, dizendo que as empresas tinham medo de dar a cara a bater (e por isso doavam por debaixo dos panos).
Tem mais: como lembra o jornalista Josias de Souza
em seu blog, o PSDB já foi acusado de caixa dois, de ter recebido dinheiro ilícito da - vejam só - SMPB, a tal agência do carequinha (by Roberto Jefferson). E não apenas para a eleição do então candidato ao governo de minas e ex-presidente do PSDB, Eduardo Azeredo. Caixa dois foi utilizado em 1998 para a reeleição de FHC e também em 94 - acompanhado de perto pelo então ministro da fazenda. Isso não é apenas uma acusação, é um fato comprovado por ex-banqueiro que ajudou na campanha do FHC e por inúmeras planilhas que o PSDB deixou escapar.
O FHC teve o mesmo comportamento de Lula:
Não sei de nada. (E eu nem citei a passagem em que FHC diz que Lula cometeu crime de responsabilidade).
É verdade que também somos responsáveis pelo que hoje se vê: a cada dia mais corrupção; a cada dia, menor reação. Erramos no início, quando quisemos tapar o sol com a peneira no caso do senador Azeredo.
Não se tapa o sol com uma peneira quando
você tem um telhado de vidro.
O não à corrupção, não nos iludamos, é a condição para o futuro, tanto do país como nosso. Mas não basta a diferenciação moral. Há problemas urgentes que afligem o povo e sobre os quais não podemos calar. O mais angustiante é o medo: medo do crime, da violência. Também neste caso o PSDB tem responsabilidades e tem o que dizer.
FHC diz que o não à corrupção é condição para um bom futuro. Logo depois cita o problema da (falta de) segurança em São Paulo. Ora,
a condição "para o futuro" é a educação. O PSDB governou São Paulo por 12 anos. 12 anos - um ano a mais do que um estudante precisa para completar seu estudos(ensino fundamental + médio). Se houvesse uma real preocupação com a educação desde o começo deste ciclo,
a violência hoje seria bem menor. Nunca houve nesse país investimentos a longo prazo para a educação. Sempre querem retornos de curto e médio prazo, pois rendem mais nas urnas e na popularidade.
O maior problema da violência não é a falta de emprego (que, aliás, foi o grande problema dos 8 anos de FHC na presidência, contribuindo também para o aumento da violência). É a falta de estudo que capacita os jovens para um bom trabalho. Sem uma boa educação, o jovem recorre às ruas e ao crime para se dar "bem na vida". Os criminosos de hoje, a maioria na faixa de 20~25 anos, foram as mesmas crianças e jovens que deixaram de ter bons estudos nos últimos 12 anos. E eu estudei muitos anos em escola pública, sei do que estou dizendo.
Me irrita que nenhum político (com exceção do Cristovam) tome a educação como prioridade. Me irrita ver que nenhum político diz que o verdadeiro problema da violência está na educação.
Sem reforma da Previdência (o que foi aprovado não teve seqüência nas leis complementares e portanto nada mudou de fato), tornou-se impossível baixar os juros há mais tempo. Assim, para manter a boa apreciação dos credores internos e externos, o superávit primário teve que se manter nas alturas, sufocando os recursos para a construção de estradas e da infra-estrutura em geral. Quem pagou o preço? O povo, através dos impostos.
Às vezes eu acho que o FHC esquece que foi presidente desse país. Como ele tem coragem de dizer que o atual governo pecou na reforma da previdência? Posso estar errado, mas eu não lembro dele ter feito reformas em seu governo... Superávit primário? O superávit que aí vemos resulta de um acordo fechado pelo próprio FHC com o FMI meses antes de deixar o governo! O Palocci, excelente político, ainda aumentou o superávit depois de ver que ele era insuficiente - e, na verdade, ainda é. Não critico o aumento, mas sim o FHC pagar uma de santo agora.
Por fim, esses impostos. Gozado, em 94 a relação imposto/PIB era de 24%. Em 2002, era de 36%. Em anos, cresceu mais de 10 pontos percentuais. Lula (Palocci, na verdade) já faz um milagre fazendo o país crescer razoavelmente bem sem que a carga tributária cresça no mesmo ritmo. O aumento de 2~3% que vimos de 2003 para cá é resultado da expansão do país.
...com as sucessivas nomeações de "companheiros" e aliados, sem a devida qualificação técnica.
FHC deve ser como a maioria dos brasileiros: tem memória fraca. Ele não lembra que entregou cargos e cargos ao PMDB durante seus anos de mandato, especialmente em 1997 para garantir a reeleição. Mais um excelente jornalista, Fernando Rodrigues, faz questão de lembrar isso
no seu blog.
Há outros temas nos quais o PSDB pode e deve marcar sua identidade. (...) Entre estes a educação prima. O PSDB tem a responsabilidade de lutar por seu legado. O que fizemos no governo federal e em alguns governos estaduais em matéria educacional é muito valioso. Não se trata apenas do aumento da matrícula em todos os níveis do ensino, mas de uma mudança de mentalidade: a preocupação com avaliar e a introdução de novas técnicas de avaliação de resultados, a diferenciação de salários de acordo com o desempenho dos professores, a formação de fundos de pesquisa (infelizmente contingenciados)...
Corujinha do O RLY? para o ex-presidente. Ele acaba de confessar que a educação de seu partido prima não pela educação a longo prazo, mas sim pelo marketing e populismo que novidades e recordes possam gerar. De nada adiantar colocar 98% das crianças nas escolas se você não garante para elas um estudo firme, decente. De nada adianta as crianças estarem na escola sem aprender e passarem de ano de forma automática, como se fosse mágica. O ENEM foi a grande piada de FHC, e o Lula conseguiu fazer dele algo útil - embora eu ainda acho o ENEM um fracasso.
Claro, é preciso começar a tal "revolução na educação", e o primeiro passo é justamente colocar as crianças na escola. Mas não devemos fazer isso de forma deliberada, apenas pegar as crianças e jogá-las para dentro da saula de aula. Tem de haver planejamento, pensamento de resultados no longo prazo, não pensar no imediatismo.
Enfim, não quero me alongar demais. Poucos acessam meu blog, e acho que nenhum vai ter coragem de ler o que escrevi nesse post.
FHC ainda comentou sobre as privatizações e o mundo globalizado. Concordo com ele que as teles modernizaram o país, mas por um custo MUITO CARO para a população (quase 500% de infalação nas taxas telefônicas desde a privatização!).
Para os que ficaram nervosos com as minhas críticas ao FHC, saibam que nos próximos dias comento a entrevista do ex-presidente Collor. E nessa entrevista vou citar pontos em que tanto Collor quanto FHC possuem o mesmo pensamento que eu tenho, como a compra deliberada de votos com o Bolsa Família.
Se você chegou até aqui, putz... Obrigado, você deve mesmo gostar de mim :)